Estou há dias para escrever sobre isso.
Segurança! Nos últimos dias temos visto muito essa palavra
ecoar pelos meios universitários, e o surgimento de um debate acerca deste
tema. Que a luta travada hoje na USP é uma luta a respeito da segurança no
campus, da segurança dos estudantes.
Antes de entrar na questão “segurança”, o que tem que estar
colocado hoje na USP é que existem 73 presos políticos. O que
está colocado hoje na USP é uma repressão brutal ao movimento estudantil e de
trabalhadores. O que está colocado hoje na USP é, desde a ditadura militar, um
dos maiores ataques à liberdade de manifestação. Então, antes de pensarmos “segurança”
temos que pensar em como vamos
defender esses 73 presos políticos e exigir
a retirada dos inquéritos, enxergando a importância dessa luta por entender
que 73 punições à lutadores representaria uma derrota e um retrocesso
inimaginável à TODOS aqueles que se colocam em luta. E isso não é exagero! Se deixamos passar que uma desocupação aconteça da maneira como aconteceu na reitoria da USP, estaremos entregando nas mãos da polícia todas as ocupações de terra de movimentos sem-terra e as ocupações urbanas de movimentos sem-teto. Estaremos permitindo que nossas greves e manifestações sejam também brutalmente reprimidas. Estaremos nos atando, abrindo mão de nosso próprio direito de lutar e nos manifestar.
Agora, com relação à segurança. Em primeiríssimo lugar, acho
que se perguntar “como e que tipo de segurança queremos para os estudantes da
USP” é um equívoco, e traduz um pensamento totalmente elitista! Pensar que não queremos a PM dentro da USP porque isso
fere a autonomia universitária, e porque a universidade é um local de produção
de conhecimento e isso não é possível com um fuzil apontado para a testa ESTÁ
CORRETO! Mas não é o suficiente. Eu
quero a PM fora da USP também por
esses motivos citados, mas porque a sua
função social é a de “manter a ordem”, e a ordem é a da burguesia! “Manter
a ordem” significa “defender a propriedade privada”, “evitar e reprimir
manifestações que questionem a ordem”, “limpar os pretos e pobres das belas
ruas dos principais pontos turísticos”. Eu quero a PM fora da USP porque ela é, por essência, assassina de jovens e trabalhadores negros. Eu quero a PM fora da USP, porque quero a PM fora das favelas, morros e periferias, porque é impossível VIVER com um fuzil apontado para a testa! Porque a PM brasileira é a mais assassina do mundo,
é a que mais tortura em períodos de dita “democracia”. Porque a PM que prendeu
73 estudantes e trabalhadores na USP é a mesma que mata, tortura e estupra nas
favelas e periferias. É a mesma polícia que, com um contingente de 4 mil
policiais, acaba de militarizar a Rocinha e lucra mais com o tráfico do que os
próprios “clássicos” traficantes. E se ela prende 73 estudantes e trabalhadores,
em sua maioria brancos, na maior universidade da América Latina e uma das mais
elitistas, em meio a um processo de alcance midiático nacional, acho que conseguimos imaginar o que essa PM
faz com jovens e trabalhadores negros nas periferias, bem longe do alcance das
câmeras!
Mas mais uma vez, sobre a segurança na USP, já que foi isso
que me propus a escrever. Mas convenhamos que não faz sentido nenhum discutir a segurança na USP por si só, sem
passar por todos esses pontos que tentei passar.
É óbvio que eu
quero a USP segura. Para toda a população que frequenta esse espaço PÚBLICO! E para isso, esse
espaço tem que ser efetivamente público, para que toda a população
frequente! E isso é o que vai trazer segurança para dentro da USP! Iluminação
SIM, mas circulação de gente,
universidade a aberta à população, com atividades abertas! Mais cursos
noturnos, bandejão nos fins de semana, moradia dentro do campus (esses últimos fazem
parte da realidade da USP, mas não é o caso de muitas outras universidades,
como as UNESP’s – muitas nem bandejão e moradia tem – e da UNICAMP). Nos dias
de festa, auto-organização dos estudantes para evitar assédios, violências, estupros,
organizando transporte e caravanas para ir embora (como aconteceu em algumas
festas na Unicamp, e ajuda bastante!).
No limite, a segurança vai vir da população frequentando a universidade. Da
população estudando na universidade. E nesse sentido, o
fim do vestibular é a melhor resposta para o problema de “segurança”
da USP – e não só da USP. Quando toda população tiver a oportunidade de estar
dentro das universidades públicas estudando, aí sim estaremos falando de locais
seguros, frequentados por pessoas! E não existe resposta intermediária, que
fique claro! Não me venha com “segurança
treinada, qualificada, não terceirizada”, o caralho a quatro! ISSO JÁ
EXISTE! Enquanto essa super segurança estiver submetida à estrutura de poder antidemocrática existente hoje, essa segurança
estará lá para cumprir o papel de polícia! E eu digo isso porque ouvi de um PM
essa semana, que entrou na UNICAMP chamado pelo chefe da segurança do campus – que,
ora vejam só, é concursado - e quando chegou e se deparou com estudantes
questionando a atitude do segurança e a PM no campus, o policial falou “a
segurança do campus tem papel de polícia dentro do campus”. Então
não me venha com “soluções” que já são vigentes e que, no limite, tem como
proposta transformar a universidade pública em um condomínio fechado e seguro
para os privilegiados que passaram no vestibular.
Agora, mais um ponto. Se vamos discutir a segurança na USP, quero
discutir qual a segurança para que os trabalhadores terceirizados não se
machuquem mais todos os dias, e nem morram, por não ter a garantia de
equipamentos certos para fazer o serviço. Assim como José Ferreira da Silva,
trabalhador terceirizado, não teve e morreu em serviço dentro da USP este ano.
Quero garantir a segurança dos terceirizados do bandejão da Unicamp, que todos
os dias se cortam com as bandejas, e se queimam com a água fervente que vaza de
um equipamento precário. Quero que todos esses terceirizados tenham a segurança
de que seu salário vai chegar no próximo mês, que seu emprego ainda será seu no
fim do ano, e que seus filhos estejam alimentados e frequentando a escola no
próximo ano. E essa segurança só será garantida com a efetivação, sem concurso público, desses
trabalhadores, com o fim da terceirização e precarização da vida, do trabalho!
Para finalizar, deixo um vídeo sobre um festival que ocorreu
em Zanon, na Argentina. Zanon é um fábrica que está completando uma
década sob controle operário. É uma fábrica sem patrão que construiu um
festival cultural sem polícia! Para aprendermos como é possível, como a segurança
do povo pode e deve ser garantida pelo povo!