domingo, 27 de novembro de 2011

Segurança: como, de quem, para quem?



Estou há dias para escrever sobre isso.

Segurança! Nos últimos dias temos visto muito essa palavra ecoar pelos meios universitários, e o surgimento de um debate acerca deste tema. Que a luta travada hoje na USP é uma luta a respeito da segurança no campus, da segurança dos estudantes.

Antes de entrar na questão “segurança”, o que tem que estar colocado hoje na USP é que existem 73 presos políticos. O que está colocado hoje na USP é uma repressão brutal ao movimento estudantil e de trabalhadores. O que está colocado hoje na USP é, desde a ditadura militar, um dos maiores ataques à liberdade de manifestação. Então, antes de pensarmos “segurança” temos que pensar em como vamos defender esses 73 presos políticos e exigir a retirada dos inquéritos, enxergando a importância dessa luta por entender que 73 punições à lutadores representaria uma derrota e um retrocesso inimaginável à TODOS aqueles que se colocam em luta. E isso não é exagero! Se deixamos passar que uma desocupação aconteça da maneira como aconteceu na reitoria da USP, estaremos entregando nas mãos da polícia todas as ocupações de terra de movimentos sem-terra e as ocupações urbanas de movimentos sem-teto. Estaremos permitindo que nossas greves e manifestações sejam também brutalmente reprimidas. Estaremos nos atando, abrindo mão de nosso próprio direito de lutar e nos manifestar.

Agora, com relação à segurança. Em primeiríssimo lugar, acho que se perguntar “como e que tipo de segurança queremos para os estudantes da USP” é um equívoco, e traduz um pensamento totalmente elitista! Pensar que não queremos a PM dentro da USP porque isso fere a autonomia universitária, e porque a universidade é um local de produção de conhecimento e isso não é possível com um fuzil apontado para a testa ESTÁ CORRETO! Mas não é o suficiente. Eu quero a PM fora da USP também por esses motivos citados, mas porque a sua função social é a de “manter a ordem”, e a ordem é a da burguesia! “Manter a ordem” significa “defender a propriedade privada”, “evitar e reprimir manifestações que questionem a ordem”, “limpar os pretos e pobres das belas ruas dos principais pontos turísticos”. Eu quero a PM fora da USP porque ela é, por essência, assassina de jovens e trabalhadores negros. Eu quero a PM fora da USP, porque quero a PM fora das favelas, morros e periferias, porque é impossível VIVER com um fuzil apontado para a testa! Porque a PM brasileira é a mais assassina do mundo, é a que mais tortura em períodos de dita “democracia”. Porque a PM que prendeu 73 estudantes e trabalhadores na USP é a mesma que mata, tortura e estupra nas favelas e periferias. É a mesma polícia que, com um contingente de 4 mil policiais, acaba de militarizar a Rocinha e lucra mais com o tráfico do que os próprios “clássicos” traficantes. E se ela prende 73 estudantes e trabalhadores, em sua maioria brancos, na maior universidade da América Latina e uma das mais elitistas, em meio a um processo de alcance midiático nacional, acho que conseguimos imaginar o que essa PM faz com jovens e trabalhadores negros nas periferias, bem longe do alcance das câmeras! 

Mas mais uma vez, sobre a segurança na USP, já que foi isso que me propus a escrever. Mas convenhamos que não faz sentido nenhum discutir a segurança na USP por si só, sem passar por todos esses pontos que tentei passar.
É óbvio que eu quero a USP segura. Para toda a população que frequenta esse espaço PÚBLICO! E para isso, esse espaço tem que ser efetivamente público, para que toda a população frequente! E isso é o que vai trazer segurança para dentro da USP! Iluminação SIM, mas circulação de gente, universidade a aberta à população, com atividades abertas! Mais cursos noturnos, bandejão nos fins de semana, moradia dentro do campus (esses últimos fazem parte da realidade da USP, mas não é o caso de muitas outras universidades, como as UNESP’s – muitas nem bandejão e moradia tem – e da UNICAMP). Nos dias de festa, auto-organização dos estudantes para evitar assédios, violências, estupros, organizando transporte e caravanas para ir embora (como aconteceu em algumas festas na Unicamp, e ajuda bastante!).
No limite, a segurança vai vir da população frequentando a universidade. Da população estudando na universidade. E nesse sentido, o fim do vestibular é a melhor resposta para o problema de “segurança” da USP – e não só da USP. Quando toda população tiver a oportunidade de estar dentro das universidades públicas estudando, aí sim estaremos falando de locais seguros, frequentados por pessoas! E não existe resposta intermediária, que fique claro! Não me venha com “segurança treinada, qualificada, não terceirizada”, o caralho a quatro! ISSO JÁ EXISTE! Enquanto essa super segurança estiver submetida à estrutura de poder antidemocrática existente hoje, essa segurança estará lá para cumprir o papel de polícia! E eu digo isso porque ouvi de um PM essa semana, que entrou na UNICAMP chamado pelo chefe da segurança do campus – que, ora vejam só, é concursado  -  e quando chegou e se deparou com estudantes questionando a atitude do segurança e a PM no campus, o policial falou “a segurança do campus tem papel de polícia dentro do campus”. Então não me venha com “soluções” que já são vigentes e que, no limite, tem como proposta transformar a universidade pública em um condomínio fechado e seguro para os privilegiados que passaram no vestibular.

Agora, mais um ponto. Se vamos discutir a segurança na USP, quero discutir qual a segurança para que os trabalhadores terceirizados não se machuquem mais todos os dias, e nem morram, por não ter a garantia de equipamentos certos para fazer o serviço. Assim como José Ferreira da Silva, trabalhador terceirizado, não teve e morreu em serviço dentro da USP este ano. Quero garantir a segurança dos terceirizados do bandejão da Unicamp, que todos os dias se cortam com as bandejas, e se queimam com a água fervente que vaza de um equipamento precário. Quero que todos esses terceirizados tenham a segurança de que seu salário vai chegar no próximo mês, que seu emprego ainda será seu no fim do ano, e que seus filhos estejam alimentados e frequentando a escola no próximo ano. E essa segurança só será garantida com a efetivação, sem concurso público, desses trabalhadores, com o fim da terceirização e precarização da vida, do trabalho!

Para finalizar, deixo um vídeo sobre um festival que ocorreu em Zanon, na Argentina. Zanon é um fábrica que está completando uma década sob controle operário. É uma fábrica sem patrão que construiu um festival cultural sem polícia! Para aprendermos como é possível, como a segurança do povo pode e deve ser garantida pelo povo!